O cenário das transferências internacionais de atletas de futebol profissional, especialmente para destinos como a Espanha, está se tornando cada vez mais complexo e repleto de desafios fiscais significativos. Recentemente, o Tribunal Supremo (STS) adotou uma postura que pode impactar de maneira drástica as finanças dos clubes brasileiros. Esta análise detalha os desafios tributários e as estratégias que os clubes precisam adotar para mitigar esses riscos.
Historicamente, as transferências de atletas para clubes da Espanha eram vistas sob uma ótica relativamente simples. Entretanto, o recente entendimento da Secretaria de Tributos espanhola classifica os direitos econômicos adquiridos por clubes espanhóis como “ativos imobilizados imateriais”. no Mesmo sentido o Tribunal Supremo entendeu que os valores recebidos pelos clubes estrangeiros são considerados ganhos de capital” (capital gain) e, portanto, sujeitos à tributação na Espanha de acordo com a legislação tributária aplicável a não residentes.
Para os clubes brasileiros, essa situação representa um desafio duplo. Primeiro, há a questão da natureza jurídica dos valores recebidos. A Lei Pelé, que regula as transferências de atletas no Brasil, define a cláusula indenizatória desportiva como uma compensação de natureza indenizatória. Isso significa que, teoricamente, esses valores não deveriam ser tributados como renda, uma vez que não representam um acréscimo patrimonial, mas sim uma compensação por quebra de contrato.
Além das implicações financeiras diretas, a abordagem espanhola pode inflacionar os custos das transações. Os clubes brasileiros, ao negociarem com entidades espanholas, precisam considerar a potencial carga tributária que pode ser embutida no preço final da transferência. Isso exige uma revisão estratégica e possivelmente um ajuste no valuation dos atletas.
A solução para essa complexidade pode residir nos tratados internacionais para evitar a dupla tributação, que estabelecem parâmetros para a tributação de rendimentos entre países. No entanto, a eficácia desses acordos depende fortemente da interpretação das autoridades fiscais de cada país. No caso Brasil-Espanha, o tratado vigente oferece espaço para contestação da tributação espanhola, especialmente através do “procedimento amigável”, que permite que um residente de um Estado Contratante submeta seu caso à apreciação das autoridades competentes para evitar uma tributação indevida.
Diante desse cenário desafiador, é crucial que os gestores dos clubes brasileiros adotem uma postura proativa – e assistência profissional adequada – tanto no momento da negociação das transferências como no posterior momento da defesa dos seus interesses perante a administração fiscal espanhola.
Em resumo, as novas interpretações fiscais exigem que os clubes revisitem suas estratégias de transferência internacional e considerem seriamente a complexidade dos acordos internacionais de tributação. A capacidade de navegar por esses desafios determinará não apenas a sustentabilidade financeira dos clubes, mas também sua competitividade no cenário internacional. A atenção aos detalhes fiscais e a preparação para contornar obstáculos legais serão essenciais para o sucesso futuro dos clubes brasileiros no mercado global do futebol.
Felipe Ferreira Silva
Diretor Geral da FBT – Faculdade Brasileira de Tributação.
Autor do livro: Tributação no futebol: clubes e atletas.
Doutor e Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP
Sócio de Pereira Filho e Ferreira Silva Advogados ([email protected])
Cristian Billard
Professor Associado Interino de Direito Tributário na Universidade de Buenos Aires (Argentina).
Doutor em Direito pela UNIPA, Palermo, Itália.
Autor do livro:
Advogado Associado do Studio Uckmar Assoc. Prof. ([email protected]).