Crédito presumido de IBS e CBS oriundo oriundo do produtor rural.

 

Primado fundamental da reforma tributária aplicável ao Imposto Sobre Bens e Serviços – IBS e Contribuição Sobre Bens e Serviços -CBS é a neutralidade. A ideia desse princípio vai no sentido de que os referidos tributos não devem incentivar distorções sobre as decisões de consumo.

Para que a neutralidade tenha um mínimo de eficácia, deve-se garantir uma não cumulatividade bastante abrangente para o IBS e da CBS. E entre as medidas do ordenamento para se cumprir tal desiderato, a Emenda Constitucional n. 132/23 previu, em seu artigo 9º, casos de créditos presumidos que podem ser aproveitados por quem adquire bens ou serviços de certas pessoas que não são contribuintes do IBS e da CBS.

Entre tais hipóteses, está a do adquirente de bens e serviços de produtor rural que possa optar por ser não contribuinte e do produtor rural integrado que realize tal opção. Vamos entender tais possibilidades.

Para tanto, rememoremos que o § 4º do art. 9º da Emenda Constitucional n. 132/2023 prescreve que o produtor rural integrado e o produtor rural com receita anual de até R$ 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) – valor atualizado, anualmente, pelo IPCA – podem optar por ser não contribuinte do IBS e da CBS[1].

Nessa seara, o ­§5º do mesmo artigo prescreve que fica autorizada a concessão de crédito ao contribuinte adquirente de bens e serviços de produtor rural pessoa física ou jurídica que não opte por ser contribuinte. O crédito presumido, observe-se, haverá de permitir a apropriação de créditos não aproveitados pelo produtor não contribuinte. Assim, não há dúvidas que a função do crédito presumido é de eliminar os resíduos de tributos na cadeia, como já havíamos assinalado.

Observando-se, agora o Texto da Lei Complementar n. 214/2025, em especial o artigo 168 que trata do crédito presumido, vejamos suas prescrições. Muito bem. O § 1º de tal dispositivo trata da emissão de documento fiscal da aquisição do bem pelo integrado. A disposição é a seguinte:

§ 1º. O documento fiscal eletrônico relativo à aquisição deverá discriminar:

I – o valor da operação, que corresponderá ao valor pago ao fornecedor;

II – o valor do crédito presumido; e

III – o valor líquido para efeitos fiscais, que corresponderá à diferença entre os valores discriminados nos incisos I e II deste parágrafo.

Nos termos dos § §3º e 4º  do mesmo artigo, o valor do crédito presumido será o resultado da aplicação dos percentuais estabelecidos por ato conjunto do Comitê Gestor do IBS e Ministério da Fazenda, sobre o valor líquido da operação. Assim, por exemplo, se o valor líquido da operação é R$ 100,00 e o percentual do crédito presumido estabelecido pelo Comitê Gestor e Ministério da Fazenda  é 26% (vinte e seis por cento), o crédito presumido será de R$ 26,00.

Poder-se-ia questionar “como é possível calcular o crédito presumido sobre o valor líquido se este já é resultado da diferença entre o valor total e o próprio crédito presumido?”. Haveria uma circularidade?

A resposta é negativa e a “solução aritmética” é o fato de que tais percentuais são estipulados pelo Ministério da Fazenda e Comitê Gestor, como já assinalado. Ora, de posse de tal percentual e do valor total da operação, uma simples equação de 1º grau nos permitiria identificar o crédito presumido e o valor líquido da operação.

Imaginemos, por exemplo, que o valor total da operação é R$ 126,00 e o crédito presumido tem como alíquota 26%. Como sabemos que o valor líquido mais o crédito presumido equivalem ao valor total, e como sabemos que o crédito presumido pode ser calculado aplicando-se o percentual conhecido sobre o valor líquido, poderíamos esboçar a seguinte equação, em que a incógnita “Y” representa o valor líquido:

 

126 = Y + Y*26%.

126 = 1,26 Y;

100 = Y.

 

Logo, no exemplo acima, o valor líquido da operação seria R$ 100,00. Aplicando-se o percentual de crédito presumido sobre ela, chegaríamos ao valor de R$ 26,00.

Pois bem. Como dissemos há pouco, os percentuais dos créditos presumidos devem ser definidos e divulgados anualmente até o mês de setembro, por ato conjunto do Ministro de Estado da Fazenda e do Comitê Gestor do IBS, e entrarão em vigor a partir de primeiro de janeiro do ano subsequente. Assim, em setembro de 2.026 deveremos saber os percentuais aplicáveis a 2027, quando passa vigorar o regime do crédito presumido.

Tais percentuais poderão ser diferenciados, observadas as categorias estabelecidas em regulamento, em função do bem ou serviço fornecido pelo produtor rural ou pelo produtor rural integrado. E é compreensível que seja assim, porque cada tipo de cadeia pode ter suas características e a missão do crédito presumido é efetivamente desonerar o resíduo da cadeia, o que não seria possível caso houvesse uma grande “regra geral” sem se observar os parâmetros de cada área.

 

Mas, como o percentual deverá ser calculado? Como metodologia, o § 5º prevê que a determinação dos percentuais:

I – será realizada, nos termos do regulamento, com base nas informações fiscais disponíveis;

II – resultará da proporção entre:

a) montante do IBS e da CBS cobrados em relação ao valor total dos bens e serviços adquiridos pelos produtores rurais não contribuintes; e

b) valor líquido dos bens e serviços fornecidos pelos produtores rurais não contribuintes a que se refere o inciso III, isto é, o valor líquido que corresponde à diferença entre o valor da operação e o crédito presumido; e

III – tomará por base a média dos percentuais anuais relativos às operações realizadas nos 5 (cinco) anos-calendário anteriores ao do prazo da divulgação previsto  (setembro).

Ora, vimos que o §5º do artigo 9º da Emenda Constitucional n. 132/23 determina que o crédito presumido deve ser calculado para permitir o aproveitamento de crédito não apropriado pelo produtor rural. Entendemos que essa prescrição foi acatada pela Lei Complementar que crava como método a identificação do IBS e CBS arcados pelo produtor rural.

Exatamente, por isso, aliás, o §7º do artigo 168 da Lei Complementar n. 214/25 prescreve que, para cálculo do crédito, não serão levadas em conta as aquisições de bens e serviços de uso e consumo do produtor rural ou pessoas a ele relacionadas. E tal previsão nos parece coerente, haja vista que os contribuintes no regime regular não se apropriam de créditos relativos a aquisições do chamado “uso e consumo” que estão previstas no artigo 57 da referida Lei Complementar.

Avançando, entre 2027 e 2031, o cálculo poderá abranger períodos menores do que 05 anos, o que nos parece evidente já que a reforma passa a ser vigente a partir de 2026.

Por outro lado, o direito de apropriação do crédito presumido aplica-se também à sociedade cooperativa em relação ao recebimento de bens e serviços de seus associados não contribuintes do IBS e da CBS, por serem produtores rurais, e não optantes pelo Simples Nacional, inclusive no caso da opção pela alíquota zero inserida no regime do art. 271 da Lei Complementar (regime específico das cooperativas).

Por fim, aponte-se que o crédito presumido poderá ser utilizado para dedução, respectivamente, do valor do IBS e da CBS devidos pelo contribuinte, permitido, ainda, o ressarcimento, Essa previsão, que não existe para diversas outras modalidades de créditos presumidos, é relevante para se garantir a efetiva desoneração dos resíduos tributários.

Explicado o regime normativo, resta aguardar a regulação que deve ser editada em breve, para se conhecer os meandros das obrigações acessórias. A ver.

[1] Sobre o tema, vide: CALCINI, Fábio Pallaretti. Crédito Presumido na cadeia de agronegócio para IBS/CBS. Parte 1. (In: www.conjur.com.br/2025-ago-22/credito-presumido-na-cadeia-do-agronegocio-para-ibs-cbs-parte-1/); e CALCINI, Fábio Pallaretti. Crédito Presumido na cadeia de agronegócio para IBS/CBS. Parte 2. (In: www.conjur.com.br/2025-set-12/credito-presumido-na-cadeia-do-agronegocio-para-ibs-cbs-a-lei-complementar-214-25-parte-2/) Vide também: McNAUGHTON, Cristiane Pires. McNAUGHTON, Charles William. Curso de IBS e CBS. De acordo com a EC 132/23 e a LC 214/25.  São Paulo: Editora Noeses, 2025. pp. 416/422.

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