O Projeto de Lei nº 1.087/2025, atualmente em tramitação no Congresso Nacional, propõe a criação de uma alíquota de 10% de Imposto de Renda na fonte sobre dividendos e lucros distribuídos por empresas brasileiras a pessoas físicas não residentes. A medida corrige lacuna histórica da tributação brasileira, que permitia a remessa de dividendos ao exterior com isenção prevista no art. 10 da Lei nº 9.249/1995. Provavelmente, o que deixou de ser tributado aqui será tributado no país da residência do beneficiário.
Do ponto de vista internacional, a proposta alinha o Brasil à prática de países da OCDE e do G20, que usualmente preveem incidência de 5% a 15% para dividendos internacionais. Também amplia a margem de negociação do Brasil em Acordos para Evitar a Dupla Tributação (DTA). Para as empresas, isso significa a necessidade de rever estratégias de governança tributária e de comunicação com investidores não residentes.
A mudança pode ser significativa e passamos a comentar alguns aspectos.
1. Neutralidade e isonomia fiscal
A retenção de 10% gera tratamento distinto entre residentes e não residentes. Enquanto o não residente sofre tributação definitiva, o residente pode ou não ser alcançado pelo novo Imposto de Renda Mínimo (IRPFM), também previsto no PL nº 1.087/2025. Caso seja sancionada a Lei, as empresas precisarão monitorar essas diferenças para orientar adequadamente seus acionistas.
2. Dupla não tributação
Sem tributação na fonte, dividendos enviados ao exterior poderiam escapar totalmente à tributação via estruturas offshore. A retenção de 10% garante que parte da renda gerada no Brasil seja aqui tributada. Companhias devem atentar para eventuais questionamentos de investidores.
3. Regra de crédito tributário
O PL prevê crédito ao beneficiário não residente quando a carga total (IRPJ + CSLL + IRRF) superar a alíquota nominal de IRPJ e CSLL (hoje, em torno de 34% para muitas empresas). Como alíquotas efetivas das empresas são frequentemente menores, é provável que poucos tenham direito ao crédito. As companhias deverão avaliar, em conjunto com seus controladores estrangeiros, se o crédito será efetivamente reconhecido em cada jurisdição, antes de projetar dividendos líquidos.
4. Prazo de 360 dias
O prazo para requerimento do crédito é inferior ao padrão do CTN (5 anos), podendo inviabilizar o exercício do direito por investidores estrangeiros. Empresas precisarão ajustar seus calendários de governança corporativa, auditoria e relações com investidores para garantir que os prazos sejam cumpridos.
5. Impacto sobre a rede de ADT
As novas regras deverão ter maior impacto para residentes em países sem ADT com o Brasil (como EUA e Alemanha). Ainda assim, é recomendável revisar toda a rede de tratados, dado que cada um prevê diferentes alíquotas de retenção. Áreas de relações com investidores terão de se preparar para responder a questionamentos sobre a aceitação ou não do crédito no exterior.
6. Efeitos sobre a atratividade do investimento estrangeiro
Embora a alíquota de 10% esteja em linha com o padrão internacional, a carga nominal combinada no Brasil é alta: Brasil (34% IRPJ e CSLL + 10% IRRF = 44%), México (40%), Chile (27–37%), EUA (26–36%). O risco não é apenas a retenção, mas a soma de alíquotas elevadas, rede limitada de tratados e incerteza sobre créditos. Investidores tendem a comparar taxas de retorno ajustadas a risco entre jurisdições, o que reforça a importância de análises de impacto corporativo.
7. Tratamento de paraísos fiscais
Aplica-se alíquota agravada de 25% para rendimentos pagos a beneficiários residentes em países de tributação favorecida (Lei 9.430/1996, art. 24; Lei 9.779/1999, art. 8º; IN RFB 1.037/2010). Entretanto, dividendos são isentos (Lei 9.249/1995, art. 10), mas o PL 1087 prevê retenção de 10% quando remetidos ao exterior. Surge a dúvida: dividendos enviados a paraísos fiscais estarão sujeitos a 10% ou a 25%? Será essencial que o regulamento defina essa convivência normativa para evitar insegurança jurídica.
Conclusão
As empresas precisarão explicar as novas regras de tributação de dividendos aos seus sócios e acionistas residentes no exterior. Dependendo da jurisdição e da existência (ou não) de ADT com o Brasil, os investidores deverão reavaliar a atratividade de suas posições, atentar para regras de crédito e revisar seus planejamentos financeiros. Em caso de bitributação, podem ser necessários mecanismos de solução de controvérsias, como Mutual Agreement Procedure (MAP) e até arbitragem, se admitida. Recomenda-se que as companhias, já em 2025, avaliem cenários, revisem cláusulas contratuais e preparem relatórios específicos para investidores, a fim de evitar surpresas quando a regra entrar em vigor.